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Embate entre Doria e Bolsonaro vai além da vacina e atinge ao menos oito obras em São Paulo

Segundo o governo paulista, as obras pendentes de realização na capital e no interior somam quase R$ 5,9 bilhões em investimentos, de ponte e duplicação de rodovia a canal e piscinão

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Segundo o governo paulista, as obras pendentes de realização na capital e no interior somam quase R$ 5,9 bilhões em investimentos, de ponte e duplicação de rodovia a canal e piscinão.

Por Carolina Linhares, Folha de SP. O antagonismo adotado pelo governador João Doria (PSDB) em relação ao presidente Jair Bolsonaro (sem partido) ultrapassou a retórica inflamada e a já conhecida guerra da vacina e hoje é apontado como um empecilho para ao menos oito projetos do Governo de São Paulo que dependem da administração federal.

Segundo o governo paulista, as obras pendentes de realização na capital e no interior somam quase R$ 5,9 bilhões em investimentos, de ponte e duplicação de rodovia a canal e piscinão.

Nos bastidores, aliados de Doria atribuem as dificuldades e os atrasos à má vontade de Bolsonaro com o governador paulista por considerá-lo adversário na corrida pelo Planalto em 2022. De fato, o tucano não esconde sua pretensão presidencial.

“O Governo de São Paulo estudou cada um desses projetos. Espero que o calendário eleitoral e as opiniões individuais não prevaleçam sobre os benefícios que eles trarão à população, tampouco sobre os seus impactos na retomada econômica, importante não só para São Paulo, mas para o Brasil”, diz o vice-governador e secretário de governo, Rodrigo Garcia (DEM).

Por outro lado, como mostrou a Folha, uma parceria entre governo federal e estadual conseguiu destravar o projeto do trem expresso de passageiros entre São Paulo e Campinas, uma promessa em discussão há 17 anos.

A vacina se tornou o maior símbolo da divergência, com Doria trabalhando pela produção do imunizante enquanto o negacionismo de Bolsonaro impedia ação efetiva do governo federal em prol da vacinação.

A nova fábrica do Instituto Butantan para a produção da Coronavac, inclusive, faz parte da lista de obras atingidas pela discórdia entre São Paulo e Brasília. Segundo o Bandeirantes, o governo federal se comprometeu com o repasse de R$ 63 milhões, que não foi feito.

O Ministério da Saúde não respondeu sobre o repasse até a publicação da reportagem.

O valor total da obra, R$ 160 milhões, acabou alcançado por meio de doações de empresas privadas. A construção teve início em novembro passado e tem previsão de ser entregue em outubro deste ano. A nova terá capacidade para produzir 100 milhões de doses da Coronavac por ano.

Além da pandemia, o embate direto tem outros palcos, como a Ceagesp e o Complexo Esportivo do Ibirapuera.

O caso da Ceagesp, presidida por um coronel da reserva da PM aliado de Bolsonaro, também é emblemático. Em outubro de 2019, Doria e o governo federal acordaram a concessão do entreposto e sua transferência para outro endereço.

A Ceagesp foi incluída no plano de desestatização do governo Bolsonaro, conduzido pelo BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social). Doria assinou um decreto para que o novo endereço tenha acesso a rodovias expressas e duplicadas, enquanto planejou um centro de tecnologia e inovação para o desenvolvimento de startups no endereço atual.

Em dezembro passado, Bolsonaro esteve no local e, em meio à aglomeração de simpatizantes, afirmou que “nenhum rato vai sucatear isso aqui pra privatizar para seus amigos”.

O BNDES respondeu que o projeto está na primeira fase, de formulação do modelo de desestatização, que deve ser concluída no primeiro trimestre deste ano.

“Os estudos serão entregues ao PPI [Programa de Parcerias de Investimento do Ministério da Economia] para tomada de decisão sobre continuidade do projeto e qual modelo seguir”, diz em nota. O Ministério da Economia não enviou resposta até a publicação da reportagem.

O Governo de São Paulo também vê interferência direta de Bolsonaro no caso do Complexo Esportivo do Ibirapuera. Doria anunciou no ano passado a concessão do ginásio, que incluirá a construção de uma arena para 20 mil pessoas.

O presidente foi procurado por atletas contrários ao projeto, e o Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), órgão federal, abriu processo para discutir o tombamento do local. Procurado pela Folha, o Iphan não respondeu.

O edital seria publicado em março e a assinatura da concessão estava prevista para junho –as obras levariam cinco anos. De qualquer forma, o processo foi paralisado em dezembro por uma liminar da Justiça de São Paulo que atendeu ao pedido de atletas.

Auxiliares de Doria se dividem sobre os embates com o governo federal. Parte vê exagero do governador no confronto, o que acaba prejudicando a população paulista.

Tucanos avaliam que Doria deveria delegar as declarações contra Bolsonaro a algum secretário ou aliado, enquanto manteria as relações com o presidente no nível institucional.

Há aliados do governador, no entanto, que endossam suas investidas contra o presidente –em geral disparadas nas entrevistas à imprensa e elaboradas por ele próprio. Para esses, é impossível deixar sem resposta as ameaças de Bolsonaro à democracia e à vida, sobretudo considerando que São Paulo não é tão dependente da verba federal como outros estados.

Mas foi a falta de recursos federais que travou a construção do Piscinão Jaboticabal, na região metropolitana. O objetivo é armazenar 900 mil m³ de água na divisa entre São Paulo, São Bernardo do Campo e São Caetano do Sul, beneficiando 500 mil pessoas.

A obra de R$ 132 milhões deveria começar em abril deste ano e durar um ano e meio. O consórcio RAC Jaboticabal venceu a licitação, mas a homologação não pode ser feita porque a Caixa Econômica Federal não liberou R$ 100 milhões.

Segundo o governo do estado, houve várias reuniões em que o banco estatal sinalizou que o financiamento seria viabilizado, mas o contrato não foi assinado. À reportagem a Caixa afirmou que não existe obrigação de repasse, pois não há contrato, e que as estratégias de financiamento são iguais para todo o país.

Outro imbróglio é a construção da ponte Santos-Guarujá, que depende do aval do Ministério da Infraestrutura por envolver o Porto de Santos e deve levar ao menos quatro anos. A pasta pediu uma série de alterações no projeto, que foi refeito pelo governo paulista três vezes e teve sua última versão entregue em novembro —após uma série de reuniões desmarcadas pelo governo federal.

O Ministério da Infraestrura afirmou que a ligação entre as duas margens do porto é desejada e que defende “uma solução que atenda às demandas da sociedade e não impeça as operações portuárias atuais e futuras”.

A pasta declarou em nota que a última proposta do governo paulista está sendo analisada “juntamente com a alternativa de túnel para definição da solução mais adequada”.

Em situação semelhante, com estudos apresentados e à espera da aprovação do DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura Terrestre), está a obra do Canal de Avanhadava na Hidrovia Tiete-Paraná. O prazo de entrega, caso a licitação seja liberada em breve, é 2024.

O DNIT informou que o projeto foi analisado, que solicitou correções e aguarda que elas sejam apresentadas pelo Departamento Hidroviário de São Paulo. A previsão de aprovação é até o final de abril.

Somente após articulação política saiu um entendimento entre o governo paulista e a Anac (Agência Nacional de Aviação Civil), no fim de janeiro, a respeito do People Mover, monotrilho que ligará a estação da CPTM e o aeroporto de Guarulhos.

A verba para a construção, R$ 175 milhões, será descontada da outorga de concessão paga pela GRU Airport à Anac. Agora, a previsão é que o aval da agência para o emprego dos recursos seja dado na segunda quinzena de março.

O Ministério da Infraestrutura afirmou que o People Mover envolveu um processo de concorrência feito pela GRU Airport, análise da Anac para incorporar o investimento à concessão em andamento sem risco à manutenção dos serviços e teve a participação do Tribunal de Contas da União, de forma que só houve embasamento suficiente a favor da obra no fim de 2020.

A pasta afirmou ainda que a implementação depende da alteração do contrato de concessão, o que está “em fase de negociação”.

Por fim, caiu mal no governo Doria o anúncio do ministro da Infraestrutura, Tarcísio Freitas, que duplicaria a rodovia Rio-Santos somente no trecho fluminense. O governo paulista quer duplicar o trecho no estado por meio de concessão e, por isso, pleiteia a autorização do DNIT.

O DNIT afirmou que está fazendo os levantamentos visando a estadualização do trecho paulista, como pedido pelo governo Doria. O Ministério da Infraestrutura afirmou que a escolha de trechos para a duplicação obedecem a estudos sobre geometria e volume de tráfego.

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