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O que fazer para não voltarmos a empilhar tijolos após a recente hiperinflação de materiais

Apesar de sermos a segunda reserva mundial de minério de ferro e o 6º maior produtor de aço, menos de 0,1% dos nossos edifícios de múltiplos andares são feitos de aço. Nos países desenvolvidos essa proporção situa-se entre 30 a 70%

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Um amigo e CEO de uma empresa renomada do mercado imobiliário, na qual sou conselheiro, me mandou uma mensagem que resume o pensamento da maioria das construtoras e incorporadoras nesse momento:

No início de 2020 pensávamos estar no melhor momento para uma virada histórica na centenária falta de produtividade do setor da construção. Estávamos discutindo a reforma tributária no congresso que daria a isonomia tributária entre processos artesanais e industrializados, a internet banking estava transformando o mercado bancário e de crédito, juros básicos muito baixos, dólar mais alto que o normal mas comportado, grande demanda por moradias, disponibilidades de tecnologias construtivas de 1º mundo no Brasil, indústria de componentes mais sensível para a integração da cadeia produtiva, grandes investimentos estrangeiros no Brasil, etc. Imaginamos que, finalmente, seria a hora “mágica” da Construção Civil romper sua espiral descendente e dar um salto semelhante ao que a agricultura deu nos últimos 40 anos. Eu pensei que nada poderia dar errado e que finalmente poderia ser um ator importante na modernização da construção. Após 50 anos batalhando pela industrialização da construção e pela produtividade, a hora da construção tinha finalmente chegado.

Mas estamos no Brasil e por aqui tudo é instável e parece que o país foi feito para dar errado. É um país que a cada passo para frente damos um ou dois para trás.

Veio a pandemia do Covid que provocou desequilíbrio no abastecimento dos materiais cujo consumo esteve em alta devido a ajuda econômica do governo a grande parte da população, a paralisação de fabricas e  a outras dificuldades de produção. Devido à má gestão de crise entre poderes da república o dólar disparou de R$ 4,10 (janeiro/2020) para os atuais R$ 5,75. O Real foi uma das três moedas que mais se desvalorizou no mundo e com isso tivemos uma enorme inflação de insumos básicos “exportáveis” como minério de ferro, aço, plásticos, alumínio, cobre, vidro, tintas etc. Em vez de produzir no Brasil, o lucro das empresas é muito maior exportando esses insumos. Os fabricantes de componentes brasileiros ficaram desabastecidos e sem condições de suprir as construtoras que experimentavam também uma forte demanda por imóveis. Com produtos cada vez mais escassos, a lei da oferta e procura viabilizou a oportunidade de lucro fácil e imediato. Assim, o preço dos materiais “exportáveis” disparou em valores bem superiores que o crescimento do câmbio. O aço subiu de 85% a 150% (dependendo o tipo do tipo e perfil) enquanto o cimento e seus derivados (materiais menos “exportáveis”) subiram de 15 a 30%. O dólar subiu 40%.

Nesse período a reforma tributária foi “desidratada” por setores corporativos e postergada sua aprovação para ninguém sabe quando. Continuaremos assim punindo a produtividade pela industrialização e beneficiando a processos artesanais, o trabalho inseguro e improdutivo.

Os preços relativos ficaram totalmente desbalanceados, assimétricos e proibitivos para alguns sistemas construtivos que estavam em uso ascendentes. A principal consequência foi o aumento vertiginoso dos custos da construção metálica e seus sistemas complementares em relação a construção por “via úmida” em concreto, alvenaria, argamassas, etc.

Como o aço é um componente extremamente importante na construção industrializada de edifícios de múltiplos andares, essa hiperinflação setorial caiu como uma “bomba” na modernização da construção, bem como na construção em módulos off-site (em indústrias fora do canteiro). Como o aço raramente cai de preço, o realinhamento dos custos somente se dará com o  aumento relativo do concreto e seus derivados. A inelasticidade do preço do aço é tão grande que, provavelmente, somente acontecerá nos próximos 5 anos ou mais. Esse foi o maior revés que me lembro na evolução da industrialização da construção.

Será que o Brasil está fadado a permanecer empilhando tijolos em pleno século 21?

O famoso neurologista e psicólogo austríaco, Viktor Frankl , sobrevivente do Holocausto, afirmou que: “A vida nunca se torna insuportável pelas situações, mas somente pela falta de sentido e propósito”. Quando uma porta fecha, vemos que outras se abrem com possibilidades até melhores que as anteriores. Nunca podemos desanimar!!!

Tenho dedicado tempo integral desde setembro do ano passado em abrir essas portas, estudando novas alternativas para a construção pré-fabricada de alta velocidade ou para estruturas moldadas  ”in-situ” com alta precisão e produtividade.

Delineei os seguintes princípios para redirecionar a estratégia da minha empresa:

1. Minimizar o uso do aço (infelizmente) nas estruturas. Usar aço em perfis somente quando não tiver outra possibilidade. A prioridade será concreto armado de alta resistência, madeira e eventuais outros materiais economicamente viáveis.

2. Investir em desenvolvimento de formas metálicas e plásticas de alta precisão para o concreto armado moldado “in-site”. Existem diversas boas alternativas no mercado, mas que focam cada uma em resolver pontos específicos, não na estrutura como um todo. A prioridade é integrar as melhores soluções e desenvolver sistemas conjugados. Os engenheiros Danilo Lorenceto e Nelson Sato estão me ajudando muito nesse trabalho.

3. Paralelamente ao item 2, desenvolver soluções pré-fabricadas em concreto armado com peças leves (menos que 2 toneladas) para serem utilizadas em edifícios altos com ligações rígidas entre viga-pilar. Estou trabalhando com o eng. Sérgio Franco (filho do meu grande amigo Mario Franco) analisando soluções usadas na Europa, principalmente na Itália e Alemanha. Vamos projetar um sistema alternativo e convidar empresas fabricantes de pré-moldados para um desenvolvimento conjunto.

4. Mesclar as soluções do item 2 com as do item 3.

5. Analisar sistemas construtivos em madeira de engenharia (Cross Laminated Timber) disponíveis no mercado e mesclá-las com os itens 2 e 3 acima.

6. Manter o uso do Drywall para divisórias internas. Embora do Drywall tenha tido um aumento entre 25 a 65% (dependendo do tipo de parede) em comparação a uma parede de bloco com aumento de 15 a 20%, os ganhos indiretos (leveza, produtividade, eliminação de etapas, via seca, precisão e desempenho), esse sistema está se mantendo bastante viável.

7. As fachadas pré-fabricadas, embora com aumento de custos de 30 a 40% ainda se mantem viáveis pelos seus benefícios indiretos de qualidade e velocidade de obra.

8. Fachadas em Light Steel Frame que, embora com aumento significativo nos preços e ainda necessitando de muito desenvolvimento, tem grande potencial para edifícios mais altos se fabricadas em painéis off-site.

9. Manter e evoluir no uso de sistemas elétricos e hidráulicos pré-fabricados. Embora com forte aumento de custo, as alternativas feitas in loco também sofreram os mesmos aumentos. O investimento nesse item tem que ser no convencimento e capacitação das empresas instaladores que continuam sabotando a pré-fabricação, não considerando o enorme aumento de produtividade com kits pré-fabricados na formação dos seus preços.

Somos um país de incoerências. Apesar de sermos a segunda reserva mundial de minério de ferro e o 6º maior produtor de aço, menos de 0,1% dos nossos edifícios de múltiplos andares são feitos de aço. Nos países desenvolvidos essa proporção situa-se entre 30 a 70%. Infelizmente essa porta se fechou por um tempo mas as que estamos abrindo tem um potencial enorme de promover alta produtividade com custos bastante viáveis.


Fonte: Luiz Henrique Ceotto LinkedIn

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