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Qual o piso ideal para uma cozinha industrial?

Qual o piso ideal para uma cozinha industrial? E afinal o porquê da dificuldade em se escolher um piso para essa área?

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Era 2015, fui chamado na obra do centro paralímpico brasileiro, tratava-se de uma grande construtora, imaginei que iriam pedir um orçamento de projeto para o restaurante dos atletas. Encaminhei-me ao escritório central do canteiro onde fui recebido pelo engenheiro encarregado. Conversa vai, conversa vem e, finalmente, no auge da minha impaciência, eu lhe perguntei do que se tratava o orçamento. A pessoa visivelmente desconfortável e envergonhada, perguntou-me diretamente: o que eu consideraria como opção de revestimento para o piso da cozinha. Respirei fundo, pensamentos passaram-se na mente em segundos. Lembrei do temporal com trânsito para chegar naquele extremo da cidade, a conversa fiada sem propósito do engenheiro, minha caixa de e-mails lotada no escritório, enfim, concluí dizendo: – Eu tenho algumas recomendações, no entanto, acho que o senhor poderia ter perguntado por telefone, eu não iria cobrar por essa informação.

Muitos questionarão quais foram minhas recomendações naquele dia. Profissionalmente falando creio que essa seja a pergunta que mais me fizeram até hoje, seja por parte de construtoras, seja por donos de restaurantes. Qual o piso ideal para uma cozinha industrial? E afinal o porquê da dificuldade em se escolher um piso para essa área?

Primeiramente vamos conferir as normas reguladoras no âmbito de vigilância sanitária. Elas indicam características básicas do revestimento de uma cozinha industrial, é dito nas normas: “As instalações físicas como piso, parede e teto devem possuir revestimento liso, impermeável e lavável. Devem ser mantidos íntegros, conservados, livres de rachaduras, trincas, goteiras, vazamentos, infiltrações, bolores, descascamentos, dentre outros e não devem transmitir contaminantes aos alimentos”, ou ainda “Material que permite fácil e apropriada higienização (liso, resistente, drenados com declive, impermeável e outros). Em adequado estado de conservação (livre de defeitos, rachaduras, trincas, buracos e outros). Sistema de drenagem dimensionado adequadamente, sem acúmulo de resíduos. Drenos, ralos sifonados e grelhas colocados em locais adequados de forma a facilitar o escoamento e proteger contra a entrada de baratas, roedores etc. Existência de ângulos abaulados entre as paredes e o piso e entre as paredes e o teto”.

Norma sanitária

Pela norma sanitária ficou claro para você qual o piso que você pode usar? Lendo e relendo diversas vezes eu nunca entendi.

Já as normas no âmbito mais técnico, de características físicas e construtivas do material, diz que : o piso não pode ser escorregadio e ao mesmo tempo não poroso, determina porcentagem de absorção d’ água, carga de ruptura, resistência química, resistência à manchas, coeficiente de atrito (molhado ou seco), abrasão profunda, estágio de abrasão, resistência ao impacto, resistência a gretagem ( fissuras típicas da cerâmica), resistência ao choque térmico, resistência ao congelamento, expansão por umidade.

Parece esclarecedor né, pois bem, ache algum catálogo que consiga definir cada aspecto destes de forma clara e organizada. Escreva para mim se encontrar por favor.

O fato é que o ambiente de cozinha é úmido, o piso deve ser fácil de higienizar, não poroso, portanto, não pode ser escorregadio, embora viva molhado. A movimentação de equipamentos e caixas é intensa e exige resistência, além disso, saponáceos, ácidos, gorduras e outras substâncias são uma constante. Interromper as atividades de uma cozinha para manutenção de rejunte ou reassentamento de peça é algo impensável. Aí, você se encontra em uma feira de revestimentos e pergunta para o vendedor do mega stand se o piso pode ser usado em cozinha industrial, ele vai te responder: – Claro, é PI-5….Oi? O PI mede a resistência à abrasão do esmalte cerâmico do piso ou revestimento, isso quer dizer o quanto o brilho do piso é resistente. Em piso de cozinha industrial cerâmica esmaltada nunca, repita comigo nunca!

Juntando as características normativas sanitárias às técnicas temos algumas poucas opções de pisos no mercado que as atendem. Essas opções podem ser divididas em dois grupos, os monolíticos e os de peças justapostas, ou ladrilho. Ambos têm vantagens e desvantagens a considerar, que vão desde a questão estética, passando pelo custo, até o impacto no cronograma de obra.

Tipos de piso

O piso de peças justapostas, ou ladrilho, primeiramente deve ser assentado em uma base bem regularizada, o que não difere do piso monolítico. A espessura é maior neste caso, devendo ser previsto desníveis nos contrapisos osso/acabado. Um inconveniente desse piso é o fato de a peça ser de cerâmica extrudada, não havendo precisão na regularidade entre elas, ou seja, variando suas dimensões devido ao processo de queima. Isso acarreta assentamento com juntas bem mais largas, geralmente de 8 a 10mm. Estas juntas exigem que o rejunte seja tão resistente quanto o piso e seu método de secagem, com catalisador, faz com que ele grude rapidamente nas superfície das peças, tendo que para isso “untar” previamente o piso com cera. Esse piso extrudado, pode-se dizer, é a opção mais barata para um piso de cozinha industrial.

Há algum tempo o mesmo fabricante disponibilizou a opção do ladrilho retificado, ou seja, com dimensões mais precisas, exigindo juntas menores de 5mm, com isso o problema do rejunte foi minimizado. Embora seja mais caro que a primeira alternativa ainda assim economiza-se na quantidade de rejunte bem como na agilidade do assentamento.

As peças ou ladrilhos possuem ainda vantagens nas opções de formato e dimensão, além de terem peças específicas para compor cantos, quinas, rodapés, degraus, porta grelhas, podendo inclusive ser arredondadas, além das garras cônicas inferiores que aumentam a eficiência de ancoragem do piso à argamassa. A cartela de cores, pode-se dizer, segue o enfadonho aspecto de ambiente técnico de cozinhas: tons de beges amarelados e cinzas.

Chegamos a segunda opção o piso monolítico, onde destacamos o MMA – Metil Metacrilato, ou seja, piso composto por uma resina reativa à base de metacrilato. Este é o material básico para a fabricação de acrílico, também utilizado como aditivo em resina poliéster, transparente, com elevada resistência mecânica e química, altamente resistente a ácidos, álcalis, solventes e gorduras. No caso dos pisos de cozinha industrial se adiciona o quartzo, podendo inclusive ser colorido, com tamanhos médios e grossos. Esses quartzos não precisam ser polidos, como nos antigos pisos de korodur, no processo de auto nivelamento eles são envoltos pela resina transparente, lembrando quase um processo de vitrificação. São extremamente lisos, sem porosidade, graças a resina, portanto, fáceis de limpar, sendo que os pequenos grânulos de quartzo dão uma textura levemente rugosa, o que confere atrito no pisar, evitando escorregamentos mesmo estando o piso úmido.

As resinas de metacrilato curam por uma reação química chamada polimerização via radical, bastante rápida em comparação com outras reações, isso permite que os pisos de MMA sejam executados muito rapidamente, com auto nivelamento e secagem rápida.

Comparativamente com os ladrilhos o MMA parece simplificar as inúmeras fases de obra e componentes. Despensa argamassa colante AC III, despensa alinhador junta piso, despensa o martírio do rejunte e enceramento, elimina o tempo de espera da colagem e do rejunte, elimina as inúmeras peças de acabamento, rodapé, cantos etc., as quais são substituídas por detalhes na fase de execução.

O custo comparativo entre o piso de ladrilhos e o piso monolítico MMA fica na ordem de 50%, já incluídos custos de rejunte, assentamento ou aplicação, dependo do caso. Há opções de piso monolíticos mais econômicos, como os de base de resina urânica. Ficam praticamente empatados em termos de custo com os ladrilhos retificados. O piso urânico não tem resistência UV, sua textura é lisa, menos abrasiva portanto, e sem opções de cores comparados ao MMA, segue o modelito enfadonho cozinha industrial. Os ladrilhos não retificados por sua vez, ficam de 20 a 30% mais baratos do que os retificados, fazendo a diferença chegar a quase 40% do valor comparativo ao MMA.

Outra questão que deve sempre ser levantada quanto a escolha do piso é a manutenção. Imagine um hospital, onde a cozinha industrial nunca para, são 24h por dia, 365 dias por ano, de manhã, a tarde, a noite e de madrugada. Supondo que haja um problema técnico emergencial, uma patologia qualquer do edifício que exija quebrar um trecho do piso para reparo imediato. Sendo piso ladrilho faz-se o remendo com peças reservas, qualquer encarregado de reparos faria o serviço sem grandes problemas. Supondo que se tenha que fazer o mesmo remendo em um piso monolítico, somente alguém especializado, conhecedor da mistura química do processo poderá fazê-lo, e, uma vez feito o serviço não se consegue um padrão de cor igual, deixando um remendo visível entre o piso novo e o existente, uma cicatriz por assim dizer.

Pode-se concluir que não há uma única opção, há características a serem consideradas, cada qual tem seu ponto favorável e talvez desfavorável, conforme descrito. Cabe ao especificador portanto, ponderar, avaliar os materiais e suas técnicas segundo as normas, ou legislação, ou ainda dentro da realidade da obra e do cliente e decidir junto com ele, para evitar compras abusivas, que algumas vezes escondem desvios éticos, como as RTs ocultas (reserva técnica). Embora eu tenha usado da ironia para suavizar a aridez do assunto, o que dizem as normas, o que o mercado oferece e o que a viabilidade permite são justificativas para adoção do piso adequado.

Para concluir lembro de um episódio que o responsável por uma grande cadeia hoteleira, nosso cliente, me ligou e perguntou o que eu havia especificado de piso para a cozinha do hotel. Prestes a inaugurar o edifício, na véspera da copa do mundo, acabara de perceber que a construtora tinha colocado porcelanato em tudo. Fiquei sabendo tempos depois que o cliente exigiu que a construtora retirasse todo o piso da cozinha e substituísse pelo que eu havia especificado em projeto. Provavelmente algum vendedor de revestimento deva ter especificado o tal do PI-5 para o piso da cozinha industrial, junto no pacote com todo o acabamento do hotel.

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