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Tese de investimento em construtechs “hard” em no Brasil: estamos no caminho certo para solucionar os problemas urgentes do setor de construção?

Sem construtechs hard não transformaremos o modelo atual de negócio e não haverá solução para os sérios problemas da produtividade e da insuficiência crescente de mão de obra no setor de construção.

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Tenho produzido sempre conteúdos técnicos sobre tecnologia, inovação e industrialização da construção. Neste texto abordo um tema que tem me tirado o sono, mas que é de enorme importância para o setor de construção.

Sou sócio fundador e CEO da ARATAU, uma construtech de construção modular com soluções inteligentes e sustentáveis e uma Jornada do Cliente disruptiva e inédita no mercado imobiliário (pedido de patente protocolado).

Sou engenheiro civil e atuei durante 20 anos na indústria fabricante de produtos para a construção, boa parte deste tempo dirigindo operações nacionais e multinacionais. Planejei e conduzi projetos de reestruturação e de expansão por crescimento orgânico ou via M&A e trabalhei na introdução e desenvolvimento de várias tecnologias novas no mercado brasileiro. Através de planejamento estratégico cuidadoso, gestão participativa e o empenho de equipes excepcionais com as quais tive o privilégio de trabalhar, os resultados sempre foram melhores do que o planejado. Durante este período fui presidente da Associação Brasileira da Construção Industrializada (ABCI). Esta experiência e as duas décadas de indústria aumentaram a minha segurança em afirmar que, como engenheiro, eu não “empilharia tijolos”. O meu propósito passou a ser trabalhar para o avanço da industrialização da construção.

Nos últimos 15 anos fui diretor de engenharia e de negócios e/ou CEO, de empresas renomadas de engenharia, construção e incorporação. Nestas empresas, também conduzi projetos de reestruturação e implantei operações bem-sucedidas, sendo uma delas totalmente voltada para a construção industrializada. Desenvolvendo e trabalhando com equipes de alto desempenho, tive a satisfação de implementar a primeira célula de BIM na indústria privada brasileira, em 2008, além de conduzir o redesenho de processos de fast-construction e de pré-construção, que hoje são diferenciais competitivos robustos e os pilares de engenharia da ARATAU.  

Há três anos e meio optei por sair da minha zona de conforto. Migrei da posição de executivo e dirigente, com salário e bônus, para ser empreendedor. A segurança na qualidade do business plan e nos resultados que serão gerados pela ARATAU, que possui um quadro de sócios experientes e conceituados no setor de engenharia e construção, me motivaram a avançar com o projeto. Em casa, “apertamos o cinto” e nos desfizemos de ativos que conquistamos durante muitos anos de trabalho para investir na ARATAU.

No âmbito profissional, como contribuição institucional, tenho trabalhado muito para a aceleração da industrialização em nosso país, expandido a minha dedicação para muito além das fronteiras da ARATAU Sou presidente do conselho e coordenador do Núcleo de Conteúdo do C3 – Clube da Construção Civil, além de embaixador de construção industrializada e off-site do CTE/Enredes para a Rede da Construção Digital, Industrializada e Sustentável (RCDI+S), que agrega 115 empresas e mais de 1.200 profissionais da cadeia de valor da constução. Também participo da Aliança Brasileira para a Construção Modular, que compreende o ecossistema da USP (CICS, Hubic e HousingPact). Além disso, dou aulas, como professor convidado, no Mackenzie, FGV, FAAP, Poli-USP, no IDD, no ITIE e no Mestrado Profissional do IPT. Também coordeno o curso de Construção 4.0 da AEA Educação Continuada.

Sou conselheiro do HubUNION, escrevo artigos para os blogs do C3, da ConstruLiga e do Linkedin. Idealizei e coordeno o Movimento Brasil Viável, em prol da industrialização da construção. Este movimento é uma realização conjunta do C3 e do CTE/Enredes. Estas atividades institucionais e a minha trajetória, geram uma rotina intensa de convites para palestras, mediação e participação em debates em eventos nacionais e internacionais, lives e podcasts, sempre com foco em tecnologia e inovação na construção e, sobretudo, na construção off-site e modular.

Somente neste ano, até agora, contabilizei mais de 40 participações em eventos. Vale destacar que não recebo remuneração para dar palestras. As atividades mencionadas exigem enorme dedicação e empenho de tempo, mas também colaboraram para colocar a ARATAU em alta visibilidade no cenário brasileiro. A empresa está no mapa de 2023 das principais construtechs brasileiras da Terracotta Ventures.

Figura 1 – Mapa das principais construtechs brasileira de 2023

Fonte: Terracota Ventures

Completando a minha formação, fiz um MBA Executivo Internacional com ênfase em Administração Estratégica, na FIA/USP, obtive a certificação de Project Manager Professional (PMP), pelo Project Management Institute (PMI) e sou mestrando do programa de inovação na construção ConstruINOVA, pela Escola Politécnica da USP.

No final de fevereiro de 2020, praticamente no início da pandemia do Covid-19, a ARATAU foi criada. O contrato social foi registrado em junho deste mesmo ano. A ARATAU possui um planejamento estratégico robusto, embasado em um nicho de mercado com potencial expressivo e num tipo de produto no qual temos muita experiência: fabricação e montagem de casas modulares de médio e de alto padrão, em condomínios fechados.

Os clientes-alvo são as loteadoras, incorporadoras, construtoras e investidores interessados na venda integrada de lotes com casas. Eles tomam o risco de crédito e financiam os clientes e pagam a ARATAU para entregar, simultaneamente, lotes de casas modulares. Em contrapartida, oferecemos e estes clientes a Jornada do Cliente desenvolvida pela a ARATAU, desenhada para os futuros proprietários das casas (clientes dos nossos clientes).

Nesta Jornada, através de um sistema computacional – software de realidade virtual 3D, conectado ao modelo BIM – e de alguns monitores de LCD, com a ajuda de um arquiteto especializado, no stand de vendas (casa modular da ARATAU), oferecemos aos futuros proprietários uma experiência realista, imersiva e interativa. A abordagem e a metodologia desenvolvidas pela ARATAU têm potencial para melhorar a forma dos futuros proprietários adquirirem seus imóveis agilizando a tomada de decisão e estimulando o desejo de compra.  

Figura 2 – Jornada do Cliente desenvolvida pela ARATAU

Fonte: ARATAU Construção Modular

Os futuros proprietários escolhem e configuram a sua casa, a partir das opções de planta oferecidas e customizam o produto. As casas já são entregues com aquecimento solar e infraestrutura completa para automação, climatização e energia fotovoltaica. O sistema calcula o orçamento em tempo real e o arquiteto ajuda o futuro proprietário a ajustar as suas escolhas para que elas se adequem ao seu orçamento. Após as escolhas e definições, o sistema gera um orçamento preciso, o memorial descritivo de acabamentos e um pré-contrato. Assinando o documento, uma impressora 3D imprime um modelo em miniatura da casa adquirida, que será encaminhado ao futuro proprietário. Um aplicativo mobile (APP) permite o acompanhamento da fabricação dos módulos e da montagem da casa modular no terreno, em tempo real, com atualização das imagens e do cronograma. Para desenvolver a Jornada do Cliente, criamos uma outra startup, uma spin-off da ARATAU, a VRCX – Virtual Reality Customer Experience (www.vrcx.com.br) que está sendo acelerada pelo C3. A VRCX atua sob licença da ARATAU, que detém a propriedade intelectual da Jornada do Cliente.

A ARATAU visa criar um relacionamento com os clientes, ao longo do ciclo de vida do produto, oferecendo, através do APP mobile, a venda de complementos para a casa, a contratação de serviços de manutenção, de gestão do ativo, de controle/racionalização do consumo de água energia e gás e, até mesmo, a venda de um outro produto imobiliário, no futuro.

Mesmo gozando de vasto relacionamento na cadeia de valor da construção civil, mesmo com a alta visibilidade da ARATAU e de NDA’s assinados com empresas e fundos de venture capital (VC) relevantes no setor de Arquitetura Engenharia e Construção (AEC), até o presente momento não conseguimos captar recursos para fabricar e montar a primeira casa modular da empresa, que é o Produto Viável Mínimo (MVP) da startup. Aqui começa a minha reflexão, que merece atenção das lideranças e de executivos do setor, que atuam em incorporadoras, construtoras e, sobretudo, dos investidores e dos fundos de venture capital.

Compreendi, a duras penas e depois de algumas “sapatadas”, que no Brasil, uma contrutech hard no early stage, não é uma startup! Negócios digitais, também nesta fase – proptechs, por exemplo – encontram rapidamente investidores. Estes negócios possuem ticket de investimento menor, um MVP que é uma fração do de uma construtech hard (produto imobiliário completo). No caso das construtechs hard, a tese de investimento dos investidores e fundos de VC é investir somente após a entrega do MVP e do respectivo resultado. Isso chega a ser perverso para os fundadores e sócios de construtechs hard.

Vários profissionais e empreendedores experientes entendem que, no caso da ARATAU, depois do MVP entregue, a empresa iniciará a venda de lotes de casa para loteadoras, tendo a Jornada do Cliente como um forte atrativo. A empresa, portanto, gerará caixa para garantir o capital de giro e dar lastro à sua expansão. Se eu soubesse disso no início e tivesse entendido que uma construtech no early stage “não é uma startup”, teria partido para buscar recursos para incorporar um lote de 6 a 10 casas modulares em um condomínio, uma tese mais fácil de estruturar, por incrível que pareça, do que viabilizar uma única casa, o MVP de uma construtech hard

Certamente as proptechs, APP’s mobile e ainda, sistemas de controle e gestão de projeto e da execução, ajudam a acelerar e oxigenar empresas que atuam com metodologias tradicionais de construção. Porém, isso não resolve os graves problemas do setor que necessita vorazmente de ganhos de produtividade, de qualidade, gera um enorme desperdício, tem insuficiência crescente de mão de obra e não tem previsibilidade de custos e prazos. Em suma, o setor tem um grave problema a ser solucionado.

Figura 3 – Principais problemas do setor de construção

Fonte: autor

Estes problemas têm sido debatidos em fóruns setoriais e são alvo da atenção da Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC) e do Projeto Construa Brasil, do Ministério do Desenvolvimento, Indústria Comércio e Serviços (MDIC), que tem como objetivo a modernização, desburocratização, digitalização e, sobretudo, industrialização do setor. O déficit habitacional brasileiro está escalando e é consenso que a construção tradicional não tem gerado ganhos de produtividade suficientes para equacionar problemas desta magnitude. É ponto pacífico que a solução está na industrialização. 

Preocupações com os impactos do setor de construção no que tange à sustentabilidade e ao ESG, também apontam a construção off-site e modular como solução. Em suma, concentrando investimentos em proptechs melhoram-se e agilizam-se processos nas construtoras e incorporadoras que atuam com metodologias de construção tradicional, mas não estamos agindo na raiz do problema!

Sem construtechs hard não transformaremos o modelo atual de negócio e não haverá solução para os sérios problemas da produtividade e da insuficiência crescente de mão de obra no setor de construção. As ótimas – e poucas empresas de construção modular em operação – que captaram nos últimos 4 anos, não serão suficientes para atender o aumento da demanda. São empresas que já estavam operando e gerando resultados, no momento em que estes investimentos foram realizados. Ou seja, não eram construtechs no early stage, quando foram investidas e, portanto, atendem a tese de investimento dos fundos de VC.

Não há em nosso país fundos de VC ou programas de financiamento com linhas de crédito específicas para startups jovens, ou seja, antes do MVP. Os modelos de financiamento e de fomento à inovação existentes são eficazes para pesquisas acadêmicas ou para empresas que já têm histórico de faturamento. Na minha jornada, achei que conseguiria um financiamento pessoal junto ao banco com o qual tenho relacionamento há muitos anos. Contudo, para a minha surpresa, mesmo tendo um imóvel para oferecer em garantia, como empreendedor não tenho renda e os bancos não concedem financiamento nesta condição! Restou a tentativa de um home equity. O modelo, pelo meu status de 60+, oferece taxas de juros altas e prazo de pagamento curto, o que resulta parcelas de valor astronômico. Além disso, a avaliação do imóvel é realizada já com 30% de desconto, para uma eventual liquidação estressada. O empréstimo equivale a 50% do valor da avaliação e mantém o imóvel alienado, até a quitação do financiamento.

É interessante destacar que em outros países, usando os EUA como exemplo, não existe este “calvário”. No caso de uma startup como a ARATAU, em nosso estágio de desenvolvimento, há ampla oferta de crédito, de financiamento e de fomento à tecnologia e à inovação, com baixa burocracia e taxas de juros bem menores. O empréstimo é tomado pela pessoa jurídica e não pela pessoa física.

Há cerca de um ano e meio tive uma ótima conversa com um empreendedor brasileiro que é empresário nos EUA, o André Magoso. Ele era alto executivo do Google e foi enviado pela empresa para trabalhar no Vale do Silício. Chegando lá ele constatou rapidamente que faltariam casas para os executivos.

Figura 4 – André Magoso (FAB HOMES, USA)

Fonte: autor

O André não perdeu tempo. Se desligou do Google e montou uma empresa, a FAB HOMES e está fabricando e montando casas modulares de médio e alto padrão, em escala. Como temos um amigo comum, ele se interessou pelo projeto da ARATAU. Fizemos uma reunião on-line e, depois de conhecer e elogiar o projeto ele fez o seguinte comentário:

– “Paulo, se você estivesse aqui nos EUA, já teria colocado no caixa da ARATAU uns US$ 10 milhões, mas no Brasil, você vai penar para captar.”  Triste verdade…

Meus sócios e eu acreditamos plenamente na ARATAU e mantemos a nossa resiliência. Declinei, nos últimos anos, quatro propostas para retornar ao mercado de trabalho como executivo, para dirigir operações. Duas delas, com “frio na barriga”, pois são empresas muito sérias e estruturadas.

Mas o fato é que este tema precisa ser, urgentemente, discutido em fóruns setoriais, envolvendo os principais investidores e fundos de VC que atuam na construção, além de entidades privadas e agências governamentais de fomento e crédito à pesquisa & desenvolvimento e à inovação. Há que se desenvolver modelos adequados para o investimento em construtechs hard no early stage, se quisermos resolver de fato os problemas da construção civil.

Antes do MVP, o investimento em construtechs, apesar do maior risco, implica um retorno sobre o investimento muito elevado, aplicando-se um desconto considerável sobre o valuation destas startups. Taxas de sucesso maiores acontecerão se forem realizadas análises de investimentos mais aprofundadas, para entender a robustez do planejamento estratégico, a consistência da ideia e da oportunidade, a qualidade das soluções, a capacidade de gerar os resultados previstos e a experiência dos sócios.

No passado, deixei para trás oportunidades de me mudar para países com maior segurança jurídica e ambiente de negócios mais favorável e não me arrependo. Aqui em nosso país, que amo de paixão, nada é fácil, mas mantenho minha fé no futuro e num movimento estruturado de modernização e industrialização do setor. O propósito da ARATAU é “transformar a construção numa fábrica de edificações”. E o legado que gostaria de deixar é totalmente convergente com este propósito. Quero me manter trabalhando e contribuindo para o rápido e crescente avanço da industrialização do setor de construção no Brasil.

Minhas reflexões mais recentes sugerem que, enquanto o setor não encontrar uma solução para o grave problema que destaquei e que afeta sobremaneira o caminho para o futuro da construção e, portanto, o avanço da construção off-site e modular, os potenciais investidores para construtechs hard são pessoas físicas que são parentes ou amigos dos sócios ou ainda, profissionais e empreendedores que conhecem muito bem o setor de construção e as suas dores, que percebem o elevado potencial de projetos como o da ARATAU e, principalmente, a capacidade de transformação e de geração de resultados vinculados a eles.

No curto prazo, ao invés de insistirmos na tese de estruturação financeira da operação, decidimos nos concentrar na viabilização do MVP, que é uma casa modular da ARATAU com projeto arquitetônico assinado pela FGMF. Esta casa será fabricada e montada em um condomínio fechado em Itu, em um lote adquirido por um dos meus sócios.

A casa será entregue com a Jornada do Cliente já demonstrada. A VRCX concluiu a Jornada para esta casa, que é o MVP desta startup. A plataforma está totalmente funcional e, por sua vez, escalará no mercado imobiliário, desenvolvendo a Jornada para os clientes de construtoras, incorporadoras, loteadoras e de indústrias fabricantes de materiais de construção e de decoração. Afinal, trata-se de uma plataforma digital, já entregou o seu MVP e não está mais no early stage!

Figura 5 – Tela de início da Jornada do Cliente da primeira casa modular da ARATAU, desenvolvida pela VRCX

Fonte: ARATAU e VRCX

Dividimos o valor da casa modular em 6 quotas de investimento e 3 delas já estão reservadas para a nossa parceira de esquadrias. Vendendo as 3 quotas remanescentes daremos início à fabricação da casa.

Minha decisão de tratar clara e abertamente este tema, expondo as minhas preocupações e reflexões, reside na expectativa de conseguir sensibilizar lideranças e mentes brilhantes e experientes, com estrutura de capital e aptidão para investir, ou mesmo capacidade de persuasão para influenciar investidores, fundos de VC e empresas construtoras e incorporadoras, enxergando a oportunidade de investir em construrtechs hard com projetos inovadores e bem fundamentados, ainda no early stage.

Trata-se de um comprometimento com o futuro do setor de construção entendendo a gravidade do que estamos enfrentando e de deixar um legado. Afinal, a transformação setorial e a inovação disruptiva estão vinculadas às construtechs hard brasileiras, que têm proposta de valor consistente, capacidade de gestão e alto potencial para gerar ganhos substanciais de produtividade e qualidade, com previsibilidade de custos e prazos, entregando muito mais volume em prazos bem mais curtos, acelerando fortemente as empresas do setor de construção. Faz-se necessário debater exaustivamente a questão do investimento em construtechs no early estage. O setor e o País precisam de uma solução! Espero que este texto possa ser amplamente compartilhado, debatido e discutido nos fóruns setoriais, pelas entidades vinculadas à engenharia, arquitetura, construção e incorporação e pela academia.

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