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Paulo Mancio: design com foco no ser humano

Paulo Mancio, vice-presidente sênior de Design e Implantação da Accor, acredita que o hotel do futuro será muito mais um ponto de encontro, do que simplesmente um espaço de pernoite

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O executivo acredita que o hotel do futuro será muito mais um ponto de encontro, do que simplesmente um espaço de pernoite.

Marcos Martins, Hotel News. Lidar com projetos arquitetônicos, plantas e fórmulas é algo extremamente técnico, mas quando essas obras envolvem hotelaria o fator humano precisa ser considerado. Esse é um dos maiores aprendizados da vida de Paulo Mancio que, aos 50 anos, é vice-presidente sênior de Design e Implantação da Accor para a América do Sul. Formado em engenharia, ele admite que não escrevia nem lia muito bem, e como tinha esta dificuldade, seu pai o recomendou estudar Direito, que virou a segunda formação acadêmica. Depois foi para os Estados Unidos, concluiu uma pós-graduação, e depois no Brasil um MBA.

“Entrei na hotelaria por acidente. Trabalhei primeiro em construtora, focada no interior de São Paulo com obras industriais, depois numa gerenciadora de obras, e dentro dela tinha uma parte que cuidava de hotéis. Me chamaram para uma reunião com a Accor e, por coincidência, nossa empresa foi contratada para gerir vários empreendimentos hoteleiros também da Meliá, Holiday INN e outras marcas independentes”, relembra.

Com isso, Paulo começou a se especializar nestas obras hoteleiras e um diretor da Accor o elogiou. Na ocasião, disse também que a rede francesa estava buscando uma pessoa com as características de Mancio. “Até brinquei: não serve eu? Ele disse que seria sensacional. Entrei num processo de entrevistas, mas aconteceu o 11 de setembro. O mundo parou e, por conta disso, as contratações foram congeladas. Um ano depois surgiu novamente o convite e, em 2002, comecei a fazer parte do time da Accor, uma aventura incrível”.

Paulo Mancio e seu amor Juliana.

E foi na empresa que ele conheceu a sua esposa, Juliana Brandt. Na época, ela trabalhava como gerente jurídica, e eles estão juntos há mais de 15 anos. “O grupo é uma grande parte da minha carreira e nos casamos lá dentro. Nossa rotina é uma loucura, com mil atividades. Os dois são executivos e optamos por curtir muito a vida, sem ter filhos, mas com quatro pets: meu cavalo, dois cachorros (um deles é resgatado) e meu papagaio, que me adora. Somos muito felizes vivendo dessa maneira”.

Promoção a VP

Paulo Mancio começou sua trajetória na Accor como gerente de Implantação, mas até ser promovido a vice-presidente o caminho não foi fácil, e muito menos num estalar dos dedos. “Vinha sendo bastante assediado pelo mercado e, na época, o Roland de Bonadona era meu chefe. Esperava sempre uma promoção, mas em certo momento revelei que tinha recebido propostas, porém o meu desejo era continuar na Accor. Falei tudo de maneira respeitosa, em uma boa conversa. Passou mais um ano e nada. Cheguei para ele de novo, mas fui comunicado sobre uma mudança no regulamento. Para se tornar diretor/VP era necessário passar por uma avaliação de potencial em inglês”.

O executivo aceitou passar pela prova, mas um dia antes ele se machucou andando a cavalo, com a necessidade de operar o joelho. “Fiz a prova e fui direto de táxi para o hospital. Durou quatro horas, com o alemão Dirk, e no meio da avaliação eu pedi um feedback. Ele disse que nunca dava esse tipo de retorno, então pedi desculpas. Ao finalizar, ele me perguntou o que eu queria para o futuro. Para aquele momento disse que queria a vaga de VP, e mais para frente, ser presidente do grupo. Então recebi o almejado feedback de Dirk, e ele comentou que fui o melhor executivo que passou pela avaliação”.

Só que depois de um tempo como VP, o Bonadona disse que as coisas não estavam funcionando comigo. “Foi um choque e quase caí da cadeira. Ele me deu dicas relacionadas à comunicação, para deixar de ser um técnico, virando um gestor, e a Accor me pagou um coach mega profissional, que tinha sido VP de board da Natura. Trabalhei aspectos muito importantes sobre como me comunicar e a forma de me relacionar com os outros”.

Virada no design

A Accor sempre foi uma rede hoteleira tradicional, com projetos e estilos quase inalteráveis, mas com as mudanças de consumo e perfil de clientes foi preciso se reinventar. “Tivemos um momento de virada ao perceber que o encantamento pelos nossos projetos estava diminuindo, apesar de serem muito rentáveis. Houve uma provocação interna, então peguei o limão e fiz uma caipirinha. Buscamos algo novo, disruptivo e diferente, com novas maneiras de nos conectar com o hóspede, perguntando o que ele desejava. Redesenhamos tudo em vários passos, com erros, acertos, idas e vindas. O mais forte deles era o Ibis, bandeira que virou sinônimo de hotelaria, mas este foi apenas um dos cases”.

Como consequência do trabalho bem executado, Paulo ganhou um dos maiores concursos do mundo na hospitalidade, o Prix Versailles, em 2019, que reconhece projetos de arquitetura e design. O prêmio veio justamente pelo conceito Plaza, da bandeira Ibis. “Participei da cerimônia na sede da Unesco, em Paris, sendo o primeiro colaborador da Accor no mundo, entre 125 mil, a ganhá-lo. Além disso, foi a primeira vez na história da Accor que a rede aceitou o desenho de um novo conceito de hotel fora da França. Reuni arquitetos sul-americanos jovens e muito talentosos, e quem ganhou o concurso interno foi um escritório paulistano”.

Patrick Mendes, Paulo Mancio e Thomas Dubaere.
Time da Accor na América do Sul.

Sala de aula

Ao realizar cursos complementares em gestão de hotelaria, Paulo confirmou sua vocação também para dar aulas, que já era um desejo antigo. “Entre 25 e 30 anos, sempre tive vontade de ser professor até pela sede de aprender sobre vários assuntos, não apenas os técnicos. Um dia estava na Accor e tocou o meu telefone. Era um reitor me convidando para dar aula. Disse que nunca tinha feito isso, apesar de saber o conteúdo, e fui convidado a aprender o ofício”.

Paulo dá aula de gestão do patrimônio, criando um curso chamado Arquitetura Hoteleira. E entre os novos projetos, dentro de uma plataforma de ensino chamada Liga Learning, realizará o Hospitality Design, englobando meios como Airbnb, coworking, hotel, hostel, pousada e resort. É um curso muito focado no gestor, arquiteto e engenheiro, ligado ao novo mundo digital. Não adianta abrir um hotel se o lugar estiver desconectado desta realidade.

Paixão por cavalos

Muitos podem não saber disso, mas Paulo foi atleta da equipe brasileira de hipismo, e o seu maior sonho era participar das Olimpíadas. “Cheguei a participar de uma seletiva, mas nunca fui. Ainda está aceso o sonho, embora seja um pouco mais difícil com a idade, mas tudo está interligado com o ensinar e o aprender. Tem a ver como se aprimorar e atingir os objetivos”.

Esse esporte entrou na vida dele quando seu avô, que adorava cavalos, o levava para brincar, mas não tinha um companheiro de montaria. “Essa paixão começou a aumentar e sempre achei o hipismo muito bonito. Treinava na Hípica de Santo Amaro e meu cavalo, Lord Quinn, até pouco tempo, estava lá. Hoje eu moro em Alphaville e ele fica numa hípica muito conhecida aqui, a Manège. Há uns cinco anos, voltando a competir, tive um acidente e machuquei o ombro, então parei de disputar na modalidade. É um esporte que, assim como outros, também possui riscos”, assume.

Futuro e desafios

Paulo acredita que o hotel do futuro será muito mais um ponto de encontro, do que simplesmente um espaço de pernoite. “Por essência, o hotel nasceu com uma razão básica inicial: acolher o cliente fora da sua cidade natal. E a hospitalidade se dá por essa razão, sendo possível fazer isso em diversos meios de hospedagem. O mundo mudou e todos nós mudamos. Uma das coisas mais interessantes agora é a singularidade”. Ele pontua que os empreendimentos deixaram de seguir um padrão rígido, só que manter consistência sem padrão é difícil. “Se a água não é quente e o ar-condicionado não funciona, não adianta em nada. Criar esse equilíbrio é muito especial”.

Entre as dificuldades de se trabalhar na área, ele lista os desafios. “Assim que entrei na Accor, trabalhava muito mais com engenharia e construção, e depois necessariamente com hotelaria. Estava voltando de uma reunião, no carro do Francisco Sobrinho, e pedi uma dica para um jovem que quer aprender e acertar. Ele disse que, quando falamos de projeto, obra e orçamento, estamos falando de coisas. Na hotelaria falamos de pessoas, comunicação e conexões. Era outro mundo, e que eu deveria focar no meu relacionamento com gente. Logo, a minha dica é cuidar de pessoas e olhar para a essência do ser humano”.

Como consideração geral, ele afirma que muitos processos globais vão se digitalizar, incluindo profissões relacionadas a dados e repetição. “Mas nada substitui o toque humano. Quando se vive uma experiência, é algo único, é a somatória de memória e emoção. Hospitalidade é sobre perguntar também como o outro se sente, criando uma conexão. É a vontade de querer compartilhar o que se tem de melhor.

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