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Selic faz comprador adiar aquisição do imóvel

Juro a 13,75% eleva custo para financiamentos no médio e alto padrão; no econômico é aguardada decisão sobre subsídio no MCMV

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Ana Luiza Tieghi, Valor Econômico – Levantamento feito pelo Valor Data com 23 incorporadoras listadas em bolsa aponta que, em 2022, o lucro líquido dessas empresas caiu 57,8%, no consolidado, para R$ 1,3 bilhão. A margem bruta caiu 3,7 pontos percentuais, a 26,3%.

No médio e alto padrão, há temor de que os clientes não consigam se qualificar para a compra do imóvel, ou prefiram postergá-la, porque a Selic em 13,75% tem causado um aumento paulatino das taxas de financiamento imobiliário. Entre o final de 2021 e de 2022, a taxa média passou de 9,2% para 10,2% ao ano, mais TR.

Isso fez com que as incorporadoras reduzissem lançamentos no ano passado, para evitar alta no estoque. A decisão é ainda mais importante porque neste ano e em 2024 ocorrem entregas do boom de lançamentos de 2020 e 2021. Em 2022, diz a Associação Brasileira de Incorporadoras Imobiliárias (Abrainc), o volume lançado caiu 31,4% na média e alta renda.

Gustavo Cambaúva, analista de real estate do BTG Pactual, destaca que o estoque subiu 18% nas empresas que ele cobre, entre o quarto trimestre de 2021 e o de 2022.

Sem perspectiva de queda nas taxas do crédito imobiliário, está mais comum ver companhias que miram a classe média com feirões que dão descontos e condições especiais de financiamento. A Helbor fez seu evento promocional em novembro e outro em março. A EZTec está com campanha no momento. A Melnick fez o anual Melnick Day no último fim de semana.

Os eventos não atacam uma necessidade das companhias, mas levantam alerta para os analistas.

Fanny Oreng, head de real estate do Santander, destaca que já há projetos vendidos por preços menores do que no lançamento, o que preocupa. “Principalmente empresas que têm mais exposição a estúdios podem ter um nível [maior] de distrato”, diz. “Não achamos que será alto como no passado, mas vamos monitorar”.

Os estúdios são mais sensíveis porque são alvo de investidores, que podem decidir desfazer a compra mesmo com a atual Lei dos Distratos, que permite que até 50% do valor pago pelo comprador seja retido pela incorporadora.

Por ora, a regra tem funcionado: a Abrainc divulgou que a taxa de distratos foi de 9,5% em 2022, queda de 1,4 ponto percentual sobre 2021 e bem abaixo do recorde de 58% de 2016.

Os analistas são refratários às grandes promoções, ainda mais se frequentes, porque o cliente pode “se acostumar” com elas. Também geram mais despesas de marketing. “É muito ruim para o mercado a sensação de que você consegue comprar imóvel mais barato a qualquer momento”, afirma Bruno Mendonça, analista-chefe de real estate do Bradesco.

No encontro com analistas para falar dos resultados do quarto trimestre, Rafael Horn, copresidente da Cyrela, foi duro sobre descontos. “Não gostamos de modelo de ‘baciada’, real estate não é promoção”.

A companhia foi citada pelos analistas como destaque positivo do quarto trimestre, por ter mantido bons indicadores operacionais.

Já Silvio Ernesto Zarzur, vice-presidente de incorporações da EZTec, disse, em seu evento, que “para vender hoje tem que ter algum desconto”, que seria compensado pelo ritmo de vendas.

Seja por influência de descontos ou por condições especiais, as vendas responderam melhor do que o esperado pelo mercado. A Abrainc aponta alta de 67,8% das unidades vendidas no médio e alto padrão, ao se comparar com 2021. Incorporadores também já indicam que as vendas do primeiro trimestre estão positivas, ainda que difíceis, o que sugere boas prévias operacionais, publicadas em abril.

“Uma coisa é prévia, outra é resultado”, pondera Oreng. “Vender às vezes é fácil, mas o retorno é o que temos que ver”. Há preocupação sobre o efeito que descontos e a dificuldade para elevar o preço das unidades terá nas margens.

Dado o cenário, os analistas esperam queda de lançamentos no ano, para o segmento de médio e alto padrão, para evitar mais formação de estoque e projetos com margens menores. O lado bom, destaca Mendonça, é que não há preocupação sobre a saúde financeira da maioria das incorporadoras de capital aberto.

Os projetos que serão entregues neste ano e em 2024 estão mais “pré-pagos” do que a média, o que diminui o risco de distrato, deixa menos saldo para ser financiado pelos bancos e reduziu o volume de dívida que as empresas tiveram que tomar para construir.

Para Cambaúva, dado o cenário econômico, 2022 foi “melhor do que imaginava”. Mendonça diz que a situação do setor vem piorando desde 2021, mas “de forma mais controlada” do que antecipado. “O mercado ainda está respondendo aos estímulos comerciais”.

Nos imóveis econômicos, há uma divisão entre Tenda e MRV, que ainda correm atrás do estouro no orçamento causado pela elevação do custo de construção desde 2020, e os resultados positivos de Plano&Plano, Cury e Direcional.

Apesar de Tenda e MRV terem registrado prejuízo líquido no quarto trimestre, para Cambaúva, as empresas também tiveram sinais de melhora, como menos queima de caixa. “O pior já ficou para trás”, diz, porque projetos antigos, com margens menores, são cada vez menos representativos.

A Tenda tem trajetória mais definida de recuperação, mas a MRV deve ganhar impulso com a venda de 6,3 mil unidades selecionadas pelo Pode Entrar, programa da Prefeitura de São Paulo. A Plano&Plano foi a maior beneficiada, com 7 mil, e já vinha em bom momento.

Para Oreng, 2023 é o ano para ter investimentos nas incorporadoras de baixa renda. Resta saber como ficarão os subsídios para as faixas 1 (para renda de R$ 2.640) e 2 (até R$ 4.400) do Minha Casa, Minha Vida. Também se estuda uma forma de zerar a entrada da faixa inicial.

Mendonça diz estar “meio cético” sobre o desenho da faixa 1. Para ele, dificilmente virá algo que “brilhe os olhos” das incorporadoras. “Não ouvi do governo indicação de que vão ter estrutura que não dependa dos orçamentos futuros”, diz. Se isso ocorrer, pode sobrar subsídio para a faixa 2.

O problema é o tempo. As regras para os subsídios devem sair em abril, o que significa que projetos que aproveitem as mudanças não devem chegar antes do próximo semestre. Isso dificulta usar todo o orçamento previsto, de R$ 9,5 bilhões do FGTS e R$ 10 bilhões da União, 129% maior do que 2022.

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