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Será possível um ecossistema de deep tech na construção brasileira?

Numa lógica de mercado deep techs, a propriedade intelectual necessita ser mais ágil, veloz e segura. A questão da segurança é determinante, pois ela evita que artifícios jurídicos sejam utilizados como ferramentas de limitação.

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Inovação desruptiva e profunda (Deep Tech). Lucro líquido na veia. Intangibilidade empresarial como demonstração direta de vantagem competitiva.

Tudo isso é possível no ecossistema da construção brasileira?

A expressão Deep Tech foi cunhada por Swati Chaturvedi, CEO da companhia de investimentos Propel(x), para apontar startups que desenvolvam novas tecnologias por meio de ciências e pesquisas em áreas como matemática, física, biologia ou engenharia, de forma a diferencia-las de tecnologias existentes. Percebam: o conceito prevê “inovação de fronteira”, algo que se dito em voz alta e no início da idéia, pode soar para alguns como algo absurdo ou até mesmo louco – algo difícil de entender para pessoas fora do ambiente da investigação, pessoas que não pensem totalmente fora da caixa em termos de desrupção. A expressão serve para diferenciar a inovação incremental, baseada em soluções/práticas existentes no mercado, para aquelas que desenvolvem novas soluções e tecnologia por meio da investigação.

Existem dois ecossistemas neste mercado.

O primeiro é profundamente científico e envolve todo um ecossistema de “invenções” (percebam o detalhe da expressão) por parte de entidades públicas e privadas, com o intuito desenvolver, promover as ciências e estudar de forma profunda, vetores importantes e com aplicabilidade aos negócios, aos mercados e a sociedade como um todo – problemas extremamente complexos são a tônica. Sete áreas são apontadas como relevantes pelo Boston Consulting Group: Materiais Avançados; Inteligência Artificial; Biotecnologia; Blockchain; Drones e Robótica; Eletrônica e Fotônica; e Computação Quântica. Segundo a mesma fonte, estas categorias estão entre os principais eixos tecnológicos que movimentam o mercado de deep tech.

Neste primeiro ecossistema, os problemas são muito mais complexos que as start ups tradicionais (porém os lucros, como apontado no início do artigo, são exorbitantes e exponenciais). Premissas são necessárias para que o ecossistema ocorra de forma leal, ética e saudável, seja para o mercado e as empresas, seja para a sociedade como um todo. A necessidade de (A) capital para pesquisa e desenvolvimento (premissa no sistema inovativo, seja ele público ou privado), é determinante. Sem recursos, não existe P&D. (B) Sistema de aprovações regulatórias eficazes, é outro ponto determinante. A velocidade e a qualidade da aprovação impacta de forma direta nos resultados. Vejam o caso do COVID-19: existem diversas iniciativas de vacinas pelo mundo, porém os órgãos reguladores apontam que precisam de ao menos 12 meses para poder implementar – um absurdo para quem vive a isolamento social e pandemia mundial!

Outro ponto é a questão da (C) propriedade intelectual e ancoragem a entidades/corporações. Numa lógica de mercado deep techs, a propriedade intelectual necessita ser mais ágil, veloz e segura. A questão da segurança é determinante, pois ela evita que artifícios jurídicos sejam utilizados como ferramentas de limitação. Daí a questão da ancoragem a entidades/corporações fortes, que possuam background para discussões/disputas jurídicas pesadas e longas, sem que isso impacte significativamente nos projetos. As (D) redes de pesquisa em nível global, com integração relativa (preservando o núcleo central ou kernel do trabalho). Por fim, passa pela (E) conversão do ecossistema da invenção para o da inovação, convertendo o projeto de pesquisa em um produto. Para isso, as entidades (principalmente governamentais) precisam estar preparadas para receber e acolher novas idéias. Precisam de pessoas que pensem além do status quo, além da caixinha que estão acostumados (costumeiramente e como exemplificação faço uma brincadeira de que várias inovações recentes como o facebook ou a amazon, teriam dificuldades de serem lançadas no cenário universitário brasileiro, pois não temos uma linha de pesquisa do CNPQ).

O segundo ecossistema envolve as deep techs quando elas já deixaram de ser apenas uma pesquisa e se tornaram uma empresa. As deep techs levam tempo para se transformarem de ciência básica (invenção), para negócios concretos (inovação) – com público e proposta de valor definidos. A incorporação de uma startup não é o começo da história, mas um marco no desenvolvimento de uma tecnologia, quando a ciência foi comprovada e o trabalho começa a visar um determinado mercado. Portanto, possuir um (F) ambiente real de operação, é determinante para o sucesso – e líderes dispostos a se arriscarem. Muitas vezes nume deep tech ter um cenário real para implementar é mais importante do que o capital para iniciar o negócio.

O segundo ecossistema demanda quase sempre (G) tempo e escala em relação a uma inovação baseada em uma tecnologia amplamente discutida. Demanda ainda, um entendimento dos (H) riscos de mercado e de tecnologia. Muitas empresas buscam financiamento no início da pesquisa, com valores pouco expressivos. Não possuem protótipos adequados. Possuem pouco ou nenhum KPI, bem como ferramentas para avaliação de potencial de mercado. E, para piorar, como as tecnologias são desruptivas, os investidores não possuem o conhecimento específico necessário para avaliar com precisão todo o potencial tecnológico onboard. O (I) empresariamento é outro fator relevante. Grande parte da comunidade científica brasileira carece de conhecimentos básicos em gestão, marketing, vendas, contratos, funding, fluxos de caixa e rotinas gerais de negócio. Não sabem, minimamente, lidar com a lógica de mercado

Por fim, temos um ponto não menos importante e que em muito tem a ver com o item (H): a (J) comportamental. Os empreendedores das empresas deep techs possuem um modelo mental diferente, com enormes dificuldades de transito junto as empresas tradicionais. Suas formas de portar, agir e apresentar idéias são extremamente conflitantes com o modelo vigente, acrescido de seus produtos e tecnologias que possuem capacidade profunda de afetar toda uma cadeia de valor, todo um setor, todo um mercado e, quiça, toda uma sociedade. E, enquanto os líderes se enxergam em território totalmente desconhecido e com uma decisão complexa a tomar, os empreendedores se enxergam de forma incompreendida – por verem o que os outros não conseguem ver.

E o setor de construção? Vivemos um GAP duplo, bastante discutido no mercado como um todo. Vivemos um eldorado inovativo, com diversas start ups trazendo novas propostas de valor. Inovar, principalmente aumenta produtividade e reduzindo custos de operacionais e de mão de obra são determinantes para o setor. Vivemos a época da indústria 4.0 com a construção civil resolvendo questões basilares. Precisamos “pular etapas”. Precisamos entender que o Brasil possui dimensões continentais e que as soluções precisam entender essas realidades. Fazer concreto em Ananindeua (Pará) é totalmente diferente do que em São Paulo Capital ou Mineiros (Goiás).

Analisar a complexidade brasileira entendendo a importância e a interdependência das partes interessadas, bem como os seus modelos de criação de valor, torna-se a pauta. Dessa forma, alinhamos objetivos setoriais e definimos as estratégias necessárias para a implementação de soluções realmente desruptivas. Essa é a única forma que eu que vos escrevo enxergo. A única forma de compensar o GAP duplo da construção brasileira no curto prazo.

Pra terminar, deixou duas perguntas: Você, leitor, concorda com minha conclusão? Caso sim, tenho uma segunda questão: é possível um ecossistema de Deep Tech na Construção brasileira?

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